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29/07/2019

FUTURE-SE

Importante colaboração sobre o tema elaborada pelo prof Nelson Amaral.

DIGA NÃO AO "FUTURE-SE"_________________________________________________
Duas fortes e fundamentais razões para dizer NÃO ao Programa FUTURE-SE apresentado pelo MEC

Nelson Cardoso Amaral
Doutor em Educação pela UNIMEP
e professor do PPGE da UFG

O artigo 1º do programa FUTURE-SE o apresenta como tendo o objetivo de provocar o “fortalecimento da autonomia administrativa e financeira das Instituições Federais de Ensino Superior – IFES, por meio de parceria com organizações sociais e de fomento à captação de recursos próprios”.
Em primeiro lugar, o artigo 207 da Constituição Federal de 1988 (CF-1988) estabeleceu que “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. Não há, portanto, que se falar em “autonomia financeira” que pressupõe o desenvolvimento de atividades que levem a instituição à captação de recursos financeiros para a sua “manutenção e desenvolvimento”; portanto, as instituições possuem é a “autonomia de gestão financeira” e não a “autonomia financeira”, como dito no programa.
Este princípio da autonomia ficou muito bem delimitado no artigo 55 da LDB (Lei No 9.394, de 20/12/1996) quando este determinou: “Caberá à União assegurar, anualmente, em seu Orçamento Geral, recursos suficientes para manutenção e desenvolvimento das instituições de educação superior por ela mantidas”.
Portanto, à expressão sobre o fortalecimento da autonomia financeira, por meio de parceria com organizações sociais e do fomento à captação de recursos próprios, presente no artigo 1º, cabe uma única interpretação: os recursos previstos no Orçamento Geral da União serão insuficientes para a manutenção e desenvolvimento das instituições, contrariando o que estabelece a CF-1988 e a LDB, e estas terão que firmar parceria com Organizações Sociais e captar recursos próprios a sua sobrevivência.
Pode-se concluir, portanto, a PRIMEIRA RAZÃO PARA DIZER NÃO AO FUTURE-SE.

Ao dizer NÃO a Universidade ou Instituto Federal reafirmará a defesa dos termos constitucionais de que a autonomia é de “gestão financeira” e que a União precisa “assegurar, anualmente, em seu Orçamento Geral, recursos suficientes para manutenção e desenvolvimento” de suas atividades, que é um preceito contido na LDB.
Não cabe às instituições dizerem que a autonomia é financeira e não de gestão financeira e que a União não precisa assegurar recursos anuais para a manutenção e desenvolvimento das suas atividades.
O artigo 2º do programa FUTURE-SE estabelece os compromissos que as instituições se comprometem a cumprir se resolverem efetivar as suas adesões. O primeiro compromisso é o de “utilizar a organização social contratada para o suporte à execução de atividades relacionadas aos eixos previstos no § 1º do art. 1º, desenvolvidas nos institutos e nas universidades federais”.
Nota-se uma diferença importante da expressão utilizada, entre o artigo 1º e o artigo 2º, ao se referir à Organização Social; no artigo 1º fala-se em parceria e no artigo 2º fala-se em contratar. Pode-se entender, na continuidade da leitura do programa que a instituição fará uma parceria com uma Organização Social (OS) que será contratada pelo MEC e que a OS desenvolverá suas atividades conforme os termos do contrato assinado com o MEC, que não são explicitados no programa.
Fica claro que a OS dará suporte à execução de atividades relacionadas à gestão, governança e empreendedorismo, pesquisa e inovação e internacionalização, no âmbito da instituição que assinou uma parceria com a OS (§ 1º do art. 1º). O programa não apresenta quais são as atividades de suporte a serem desenvolvidas com a OS.
Cabe aqui uma única interpretação: os termos do “contrato” e do significado de “suporte” comprometerá, independentemente de suas definições, a autonomia nos aspectos administrativos, de gestão financeira e patrimonial, e da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
Esta interpretação se reforça quando se lê os dois outros compromissos a serem assumidos pela instituição: “adotar as diretrizes de governança dispostas nesta lei, inclusive ao Sistema de Governança a ser indicado pelo Ministério da Educação” e “adotar programa de integridade, mapeamento e gestão de riscos corporativos, controle interno e auditoria externa”. Não se conhece a proposta do Sistema de Governança do MEC e a linguagem utilizada supõe que as Universidades e Institutos Federais serão “verdadeiras empresas”, desconhecendo as diferenças entre instituições de ensino, pesquisa, extensão e cultura e uma simples organização empresarial que atende ao mercado. Apresenta-se, também, um desconhecimento de como funcionam as instituições quando realizam seus planejamentos, processos de decisão colegiadas, avaliação e controle por agentes internos e externos.

Pode-se concluir, portanto, a SEGUNDA RAZÃO PARA DIZER NÃO AO FUTURE-SE.

Ao dizer NÃO as instituições afirmarão que possuem capacidade e instrumentos para realizarem as suas próprias gestões institucionais e que não as delegarão às organizações sociais que são “pessoas jurídicas de direito privado”, conforme definido na Lei No 9.637 de 15 de maio de 1998.
Não cabe às Universidades e Institutos Federais tomarem decisões que desobedecem ao disposto na Constituição Federal que estabeleceu a autonomia nos aspectos administrativos, de gestão financeira e patrimonial, e da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão a ser gerida por uma instituição pública, e não por uma organização privada.

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