Maria Ângela P. R. Innocente
Em 1998 assumi a Direção da EE José Gabriel de Oliveira. Já atuava na Educação desde 1985, porém como professora, no Ensino Médio, na rede estadual, regular e suplência, em escola particular e no ensino técnico (rede Paula Sousa - CEETEPS), e também como coordenadora pedagógica. Não tinha qualquer experiência em direção de escola.
Esta escola, instalada em 1913, em Santa Bárbara D'Oeste, jurisdicionada à Diretoria de Ensino - Região de Americana, contava com classes de quinta a oitava séries, do ciclo II do Ensino Fundamental, distribuídas igualmente nos períodos da manhã, tarde e noite.
Vou descrever a seguir, algumas ações desenvolvidas em 1999 e em 2000.
Embora fosse uma escola organizada, com módulo de funcionários completo, meu diagnóstico foi a não existência do "coletivo" na escola e tampouco de uma linha de trabalho docente. A participação da comunidade era pequena, assim como a dos alunos. Os alunos tinham 63 origens diferentes, pois, apesar de ser uma escola central, a clientela do entorno era pequena, recebendo, portanto, alunos dos mais diversos bairros, inclusive da zona rural. Os professores praticamente desconheciam o Projeto Político-Pedagógico da escola, bem como não se interessavam em discutir o Regimento Escolar, que estava em processo de elaboração, nem sequer em discutir as normas de gestão e convivência, que constariam deste.
No Planejamento, juntamente com os professores, optamos por mudar este quadro. Assim, começamos a realizar algumas ações para tal.
Durante o planejamento, assistimos ao filme "Jamaica abaixo de zero", discutindo a importância do trabalho coletivo. Depois, contatei alguns colegas de profissão que pudessem socializar suas experiências com os professores e, reunidos por área, discutimos, por exemplo, o uso do teatro como instrumento de aprendizagem e a utilização da metodologia de projetos, entre outros aspectos. Também discutimos e elaboramos uma outra maneira de registrar os Planos de Ensino, de forma que, primeiro os professores se reuniram por disciplina, depois por área de conhecimento e finalmente, com o grupo-escola, de forma a propor os projetos a serem desenvolvidos durante o ano e decidir no coletivo quais seriam estes, quem seriam os responsáveis, as datas de finalização e como chamaríamos os pais a participar da apresentação dos produtos finais destes.
Em seguida, organizamos as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivas (HTPC) de forma a proporcionar o estudo dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que ainda eram praticamente desconhecidos pelos professores. Isto foi feito montando-se um cronograma de apresentação dos PCNs, pelos professores de determinada disciplina, aos demais. Após esta etapa de troca de conhecimentos, passamos a utilizar as HTPC para a troca de experiências bem sucedidas em sala de aula, também com um cronograma de apresentação dos professores de cada disciplina aos demais.
Destas ações, surgiu a ideia de trabalhar inter/transdisciplinarmente todas as áreas com o tema "Brasil" (embora o aniversário do descobrimento fosse somente no ano seguinte). Conquanto não seja possível aqui descrever tudo que foi feito, alguns produtos obtidos foram: em História, dança e teatro sobre a semana de Arte Moderna; em Artes e Educação Física, dança e teatro utilizando o tema das histórias infantis de Monteiro Lobato; em Ciências, os costumes de alimentação do povo brasileiro, trabalhando valor nutricional e custos (já integrando com Matemática), com um café da manhã coletivo preparado pelos alunos, bem como a preservação do meio ambiente (integração com Geografia), exposta através de murais referentes a trabalhos de campo realizados no entorno da escola; Matemática também trabalhou com formas geométricas, área e perímetro, através da horta feita na escola e também do tema "Folclore", com um concurso de pipas. Também trabalhamos o civismo, realizando eleição de bandeira para a escola, e este desenho passou a ser estampado na camiseta de uniforme da escola, no ano seguinte.
Os concursos tinham como premiação a entrega de medalhas, em ato público. E a "apoteose", foi a apresentação no Teatro Municipal (lotado), da peça desenvolvida pela professora de Língua Portuguesa, auxiliada pela de Artes, com alunos do noturno, com o título e tema "500 anos da Literatura Brasileira", que foi aplaudida de pé pelos presentes e que ajudou a encaminhar alguns dos alunos participantes para a carreira teatral, para a capoeira e elevando sua auto-estima, o que também resultou na melhoria da aprendizagem.
Num segundo momento, conseguimos a presença dos músicos dos instrumentos de corda da Orquestra Sinfônica Municipal de Americana, para apresentação, no pátio da escola, de obras de Villa-Lobos. O coral da escola, cuja instrutora era paga pela Prefeitura, também apresentou músicas folclóricas brasileiras. E ainda conseguimos aumentar a participação dos alunos na Fanfarra da escola, cujo instrutor também era pago pela Prefeitura, reformando os instrumentos que estavam danificados, e fizemos brilhante apresentação no desfile de 7 de setembro, com os alunos sendo acompanhados por pais, funcionários, professores e direção; tendo as balizas sido ensaiadas pela professora de Educação Física.
Fizemos uma parceria com a LATASA S/A, para reciclagem de latas de alumínio, as quais eram entregues na indústria, em São Paulo, bimestralmente, por um pai "Amigo da Escola", e trocadas por objetos de interesse da escola (decididos junto com alunos e professores e os colegiados), dependendo da quantidade arrecadada, como bolas, aparelho de som, mesa de ping-pong, e outros.
É lógico que tudo foi muito trabalhoso, envolveu custos, e por isso, além de contar com verbas públicas para manutenção da escola, fizemos uma Festa Junina e uma Festa da Primavera (estas festas passaram a fazer parte do calendário da escola, porém não somente com o intuito de arrecadação de fundos, mas sempre utilizando-nas para atrair os pais a verem os produtos finais dos projetos desenvolvidos na escola, que eram apresentados nestas ocasiões); emprestamos móveis para o cenário da peça; conseguimos o teatro gratuitamente, em parceria com a Prefeitura Municipal, que também nos cedeu os técnicos para a utilização do som e da iluminação, bem como de mães que costuraram os figurinos, não só no teatro, como nas demais apresentações, e o envolvimento de toda a equipe escolar, incluindo os funcionários no planejamento das ações, para que entendessem o propósito pedagógico de tudo aquilo, e não vissem como "bagunça que dá trabalho para limpar".
Estas arrecadações também nos permitiram colocar uma tela de proteção sobre a quadra da escola, pois, apesar de ter alambrados, muitas bolas os ultrapassavam e eram perdidas ao cair na rua. Ainda conseguimos comprar um computador para o trabalho na secretaria e alguns “cd-roms” escolhidos pelos alunos.
Falando em “cd-roms”, tomamos o cuidado de utilizar parte das HTPCs para capacitar os professores no uso da informática, pois na época a escola contava com Sala Ambiente de Informática (SAI), com cinco computadores. Também fizemos uma parceria com uma escola de informática vizinha da escola, que se propôs a capacitar os professores, fora de seu horário de trabalho, mediante adesão destes. Para a utilização desta sala, bem como sala de vídeo, que deveriam ser reservadas com 48 horas de antecedência, elaboramos uma ficha de reserva de uso, onde constavam os temas a serem trabalhados, os objetivos, data, horário, etc. Além disto, enviamos ofícios a escolas técnicas de informática da região, oferecendo estágio na área, sem remuneração, mas podendo oferecer o vale-transporte, custeado pela APM. Como eram poucos computadores, os alunos trabalhavam em duplas ou trios, dividindo-se a classe em dois grupos, um ficava na sala de aula com o professor e o outro na sala de informática com o estagiário (às vezes fazíamos de forma diferente), invertendo-se os grupos na aula seguinte.
Outras ações que promovemos foram: montamos um álbum da escola, com fotos de todos os eventos e reportagens publicadas nos jornais da cidade, alusivas a estes (passamos a tentar divulgar todas as coisas boas que aconteciam na escola); divulgação das reuniões de pais na imprensa escrita e falada (o que foi conseguido por intermédio do Grêmio Estudantil); troca das cortinas das salas de aula e da secretaria; reformas de banheiros, cozinha, despensa, esgoto,arquibancada, pisos, pintura,laboratório de ciências; aquisição de vidrarias para este laboratório; aquisição de balança antropométrica; readequação do espaço e mobiliário para sala de leitura; construção de mesas de alvenaria sob árvores, constituindo nossa sala de leitura ao ar livre; participação em projetos da Secretaria da Educação Municipal; implementação de programa de prevenção ao uso de drogas, em parceria com o “Amor Exigente” e outras instituições, realizando palestras e outras ações na escola; dinamização do uso das salas-ambiente (neste ponto, o sucesso não foi absoluto, mas iniciamos o processo); participação em ações de solidariedade, como arrecadação de alimentos – no final de 2000, vencemos o concurso de árvores de Natal, realizado pela prefeitura, com uma árvore montada com sacos de arroz, que foram depois doados.
O envolvimento dos pais fez que viessem à escola para assistir às apresentações dos produtos finais, participassem das festas celebradas e, principalmente, se conscientizassem que não é só em sala de aula, com giz, lousa e exposição do professor, que o aluno aprende.
Este envolvimento fez também que, além dos pais participarem dos eventos, passassem a participar das reuniões de pais, das Assembléias de APM e do Conselho de Escola, permitindo uma gestão mais compartilhada.
Na primeira Assembléia anual da APM, os pais foram esclarecidos sobre quais verbas a escola recebia, qual sua possível utilização (inclusive utilizamos transparências), o porquê da necessidade de contribuição para a APM; passamos para todos os pais presentes diversas prestações de contas, para os pais saberem como eram feitas. Os balancetes mensais sempre foram expostos em mural em frente à secretaria e no pátio da escola, para ciência de todos.
Outra providência tomada foi a implementação de uma "cultura de avaliação", pois tudo que era feito, também era avaliado e redimensionado, se necessário, e, no final do ano, fizemos, por escrito, uma avaliação da escola com todos os pais, inclusive para que indicassem quais projetos/atividades gostariam que realizássemos na escola no ano seguinte, qual o melhor horário para reunião de pais e outras ações que julgassem necessárias.
Também dinamizamos a participação dos alunos nos Conselhos de Classe/ Série, através da presença neste de dois representantes de classe, eleitos entre seus pares, discutindo a atuação no processo de aprendizagem, tanto dos alunos, como dos professores.
Outrossim, readequamos a ficha individual de acompanhamento dos alunos e elaboramos uma ficha para acompanhamento coletivo da classe. Os problemas elencados nesta ficha, como indisciplina, falta de interesse e participação, grupos que atrapalhavam o andamento da aula, por exemplo, eram encaminhados já na semana seguinte ao Conselho de Classe/Série; os alunos eram chamados para conversar com a coordenação, direção ou seus pais eram convocados, dando ao professor uma segurança de que os problemas não ficariam sem solução, fazendo-os sentir o apoio da direção.
O Grêmio Estudantil, eleito nesta gestão, foi sempre chamado a participar de tudo, assim indo além da organização de torneios, mas, principalmente, estando presente às reuniões de Conselho de Escola e da APM, podendo opinar nas decisões dos rumos da escola. O Grêmio também se responsabilizou pela apresentação de músicas e textos durante os intervalos dos períodos.
Ainda abrimos espaço, sob programação prévia, para a "Mostra de Talentos" dos alunos da escola, com apresentação, nos intervalos, dos grupos musicais de alunos da escola, com diferentes gêneros musicais. Este espaço também foi utilizado para a socialização de atividades bem sucedidas em sala de aula.
Uma outra ação foi, uma vez por semana, em dias e horários alternados, todas as classes da escola discutirem um tema relacionado ao tema "Ética e Cidadania". Também, nesta mesma organização, cantávamos o Hino Nacional e hasteávamos a Bandeira Nacional, e ainda, fazíamos um projeto de preservação do patrimônio, com a participação dos alunos na limpeza dos tampos das carteiras.
Fizemos ainda um projeto, com a participação de diversos professores, de pintura interna dos muros da escola, cada classe recebendo um "pedaço" do muro para pintar (compramos tinta com verbas estaduais), com o tema "Preservação da Água"; este projeto não chegou a ser concluído, por ser perto do final do ano, preço das tintas e troca de professores, que não deram continuidade à ideia.
Claro que nada disso seria possível sem o engajamento da coordenação pedagógica, da vice-direção, professores, funcionários, alunos, pais, parceiros, pois, já dizia o ditado "uma andorinha não faz verão".
Também é claro que tivemos problemas de disciplina e outros, como evasão na quinta série do período noturno (que, infelizmente, não conseguimos solucionar), que fomos resolvendo junto com o grupo, à medida que surgiam. Na avaliação do SARESP que classificou as escolas em cores, a escola recebeu a classificação "verde".
A escola foi indicada para concorrer ao Prêmio Gestão Escolar, pela Diretoria de Ensino, entre outras cinco.
Fui diretora da escola de julho de 1998 a janeiro de 2001, quando fui para a Supervisão de Ensino, função que exerço atualmente, mas ainda penso ser importante esta socialização de algo que "deu certo" e ainda hoje, de alguma forma tem continuidade, talvez não para todos que ainda estão nesta unidade escolar, mas pelo menos para os que acreditam que o ensino de qualidade é possível.
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