CONSELHO DE ESCOLA: ESPAÇO DE DISCUSSÃO DOS CAMINHOS DA ESCOLA E DA SOCIEDADE
Maria Ângela Paié Rodella Innocente[1]
Sobre os Conselhos de Escola, identifica-se uma atuação mais próxima ao cumprimento de uma formalidade, de obediência à legalidade, de solução de problemas em apoio à equipe gestora da escola, pouco restando para as decisões locais, devido à grande normatização, estabelecida por meio de Resoluções e Decretos e aos inúmeros aspectos dificultadores para que a atuação do Conselho se materialize além do plano formal. A construção da atuação do Conselho de Escola, na concepção de participação segundo Bordenave (1994) e outros autores, ainda se encontra em processo, uma construção da democracia, na escola e na sociedade.
Entendendo o Conselho de Escola como uma política de democratização na gestão da escola, visualizamos que tal política, sem maiores incentivos, fica bastante refém das ações do Diretor de Escola, como também de mecanismos de alocação de pessoal, existentes na SEE que, muitas vezes, visando atender aos interesses dos profissionais que atuam na educação, utiliza mecanismos como a remoção, o ingresso, a contratação de temporários, dificultando a formação dos coletivos escolares que se configuram fragmentados, o que atinge sobremaneira a atuação dos colegiados escolares e outras instituições auxiliares das escolas. Há outros intervenientes como as baixas remunerações e a jornada de trabalho, exercida em diferentes locais. Os recursos, insuficientes e direcionados, dificultam sua alocação no Projeto Pedagógico da escola, que acaba tendo sua identidade também fragmentada, tanto pelo fator recursos, como pelos projetos a serem executados, oriundos das esferas centrais que acabam por “atropelá-lo”. Além disso, esses projetos, em geral, não logram continuidade, ficando ao sabor das mudanças na Secretaria da Educação, deixando de ser na realidade um projeto prioritário. Em cada novo governo ou secretário, os ventos sopram para lados diferentes (BORGES, 2002). Dessa forma, nem mesmo o Projeto Pedagógico pode ser considerado expressão da autonomia da unidade escolar (VEIGA, 1996, 2001), uma vez que se materializa num coletivo fragmentado, que não consegue atender suas diretrizes e não tem recursos para alocar em seu desenvolvimento.
Na atuação do Conselho de Escola, não há programas que cativem para a participação dos diferentes segmentos da comunidade escolar, ficando sua atuação dependente do diretor ou de lideranças comunitárias, onde elas existem e se interessam por tal atuação. O Conselho de Escola, embora consultivo e deliberativo, acaba apenas, muitas vezes, ratificando decisões já normatizadas como o calendário escolar, ficando difícil o planejamento e a operacionalização de suas ações. Além da centralidade das normas, há uma desigualdade de atuação na participação dos diversos segmentos, uma vez que não há capacitação dos conselheiros para que possam entender a democracia representativa e, desse modo, atuar mais efetivamente, conseguindo abrir espaços e tempos para fazer a articulação com seus representados. Assim, questionamos se a participação desejada pelos órgãos centrais não se restringiria apenas a não haver abalos no sistema, mantendo-o em relativa harmonia, pois havendo normas legais, a participação não se materializa “porque não há interesse”, ou seja, sem considerar a não existência de condições para que aconteça. De qualquer forma, entendemos que o mesmo se dê na participação, ou seja, tem de começar de alguma forma para que possa se efetivar processualmente. Porém, mesmo com todas as limitações e dificuldades já discutidas, haver garantias legais de existência é um avanço. No entanto, isso não permite que deixemos de ressaltar a necessidade de que a participação se dê de forma efetiva e que atenda aos interesses da comunidade escolar, sem homogeneizar todas as escolas e sem manter uma participação que privilegia certos grupos em detrimento de outros, menos articulados.
Como política de democratização da gestão escolar, o funcionamento do Conselho de Escola deveria ter sua implementação avaliada (SABATIER & MAZMANIAN, 1996), para que se possa identificar as dificuldades e se façam as intervenções necessárias, caso realmente se queira que seja uma política bem sucedida. No entanto, essa avaliação deve envolver os atores escolares, para que não fique na dependência da visão apenas de agentes externos, ou que não se considere as condições em que os dados são produzidos. O aumento da democracia, por meio de novos espaços de participação, propiciados pela atuação do Conselho de Escola, configura-se como um aprendizado político de participação, ou seja, aumentando a democracia na escola há maiores possibilidades de que aconteça na sociedade, conforme referido por Lima (1995).
Quanto às questões do discurso, do legal e do real, que envolvem a participação e a gestão democrática. Embora muito se discuta a participação, é muitas vezes entendida como a execução de uma tarefa. Dificilmente a base da educação que atua na escola, formada pelos profissionais da educação e seus usuários, é consultada ou participa da formulação das políticas educacionais. Em geral, tudo ocorre de forma centralizada. Contudo, a existência do Conselho de Escola pode ser um mecanismo que além de fortalecer a gestão democrática da escola pública e a democracia na sociedade, possibilite a influência da sociedade civil na formulação dessas políticas, mediante sua organização e fortalecimento como coletivo e como principais interessados na educação que atenda suas necessidades.
Quanto ao legal, a gestão democrática da educação pública encontra-se expressa em diversos dispositivos e embasada na Constituição Federal. No entanto, o legal nem sempre se materializa e vai encontrar maiores ou menores resistências conforme atenda aos interesses dos grupos que detêm o poder, o que também poderá ser alterado se outros grupos se organizarem e forem capazes de exercer pressão sobre o instituído. Quanto ao real, os assuntos pedagógicos, dentro dos quais se insere o Projeto Pedagógico, não é corrente nem central nas pautas dos Conselhos.
Os assuntos se concentram em aspectos formais de atendimento aos ditames legais e outros aspectos administrativos, muitas vezes restringindo-se à informação ou ratificação do já prescrito ou previamente decidido pela Direção da escola. Em alguns casos, o corpo docente toma a frente das discussões sendo suas “sugestões” acatadas pelos membros representantes dos demais segmentos do Conselho de Escola, que os consideram mais preparados para tratar dos assuntos da escola.
A participação ainda é formal. Como a participação se mostra apenas formal, não se conceitua como propõe Bordenave (1994). Reforçamos, no entanto, que a participação, como necessidade humana, justifica-se por si mesma, como processo de aquisição de poder, como algo que se aprende e se aperfeiçoa.
Alçar o Conselho de Escola e a sociedade civil a níveis decisórios é um processo, uma construção, porém, em crescimento, pois entendemos que já houve evolução nesse aspecto nas últimas décadas. A conformação da cidadania, no entanto, também se restringe, com o recrudescimento do neoliberalismo.
Ainda acreditamos serem os colegiados escolares, enquanto formas de fortalecimento de seu coletivo e da sociedade, importantes para a democracia. Não podemos dizer que sem a participação da sociedade civil nos rumos da sociedade, haja democracia. O processo de construção dos coletivos, nos quais se insere o Conselho de Escola, como possibilidade de fortalecimento da democracia, é um caminho para que a sociedade civil participe dos rumos que pretende sejam por ela trilhados.
[1] Mais discussões e bibliografia completa podem ser encontradas no livro e na dissertação de mestrado da autora “Participação e avaliação: Relações e Possibilidades – Uma análise sobre a atuação do Conselho de Escola no Projeto Pedagógico e a Avaliação de Sistemas” (2011).
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