Pesquise neste site

Mostrando postagens com marcador Gestão democrática da escola. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Gestão democrática da escola. Mostrar todas as postagens

05/06/2018

ADMINISTRAÇÃO COLEGIADA NA ESCOLA PÚBLICA

por Maria Ângela P. R. Innocente

Ainda analisando a gestão democrática, Prais (1990, p.16), entende
a relação do processo de administração escolar como projeto educativo que intencional e coletivamente se empenha em elevar qualitativamente o nível cultural das camadas populares(...)tal processo procura dar aos membros das camadas populares condições de dirigir ou controlar quem dirige a sociedade. Isto sugere que o processo de democratização escolar resulta de espaços conquistados pela organização das classes proletárias. Assim (...) a administração colegiada como processo eminentemente educativo e político, quando se articula com a função essencial da escola pública, no sentido etmológico de público enquanto popular.
Para Prais (1990, p.67),
tal discurso, ao se anunciar formalmente como legalizador de uma administração participativa, reflete certamente o momento histórico em questão. Momento em que a ‘transição democrática’ se impunha como única forma possível de se assegurar o poder, já que havia uma nítida rachadura do bloco dominante: interesses militares versus interesses burgueses. Neste aspecto, o discurso é explícito quando na instituição do colegiado escolar considera de fundamental importância “a necessidade de promover a integração da comunidade-escola, para que esta corresponda às exigências sociais.
Continuando este raciocínio, Prais (1990, p.68), mostra que
numa perspectiva gramsciana, deve-se manter presente que a classe dominante para realizar sua função hegemônica deve recorrer à sociedade civil, e esta foi a preocupação dos novos dirigentes. Significa que, para se obter o consenso não basta que os valores da classe dominante se materializem a nível de legislação; é preciso também que se concretizem a nível da sociedade civil, como por exemplo, a nível da instituição escola. Pois, se a sociedade civil é espaço de circulação de ideologias contrárias, então a contradição pode vir a ser conscientemente explorada pela classe dominada, a favor de seus próprios interesses, exercendo através de seus intelectuais orgânicos uma contra-hegemonia.
Neste enfoque, Prais (1990) ainda mostra o papel da educação escolar a partir do princípio da contradição social e portanto se fundamenta no materialismo histórico, pois considera a contradição como princípio constitutivo da organização social.

Esta autora “aponta a escola como instituição integrante da sociedade civil, caracterizando-a como espaço social onde a luta pela hegemonia ideológica torna-se uma realidade”(p. 36).

Cita, porém, Ianni (1963 apud PRAIS, 1990, p. 205), mostrando que “os limites da democratização da escola coincidem com os limites da democracia na sociedade de classes”. Na administração colegiada , há a possibilidade de fazer sobrepujar os interesses coletivos sobre os interesses particulares. E continua “a administração colegiada [...] ao requerer a participação de todos os membros da comunidade escolar, rompe definitivamente com a rotina alienada do mando pessoal, ao mesmo tempo que mediatiza e efetiva decisões estruturadoras da coletividade escolar”(PRAIS, 1990, p. 57).

Embora de natureza contraditória, a administração colegiada insere-se na luta pela democratização da escola, mesmo que, por um lado identificando-se com os processos de transformação social, “cria condições concretas para a existência de uma escola comprometida com o projeto histórico da classe trabalhadora, por outro lado, esta mesma prática encontra limites, na própria concretude histórica” (PRAIS, 1990, p.17), apresentando-se ainda incipiente, nas escolas estudadas.
Para Prais (1990, p. 61),
tem-se, pois, que o surgimento da administração colegiada se caracteriza como processo resultante de uma vontade coletiva organizada no sentido de uma mudança histórica. Nesta perspectiva, o processo se coloca como fenômeno historicamente necessário, ou seja, como movimento social e também como condição de possibilidade para uma prática educativa transformadora.
Para Prais (1990, p. 73), “a avaliação é usada como instrumento de poder do professor, e não como um momento de aprendizagem, de revisão do trabalho docente ou de comprovação para o aluno de seu progresso em direção à sistematização do conhecimento”.

Alguns temas são constantes no discurso 
para uma prática democrática:

- recuperar o conceito de público enquanto popular, e a partir daí resgatar a função essencial da escola pública tendo em vista o atendimento das camadas populares.

- necessidade de discutir amplamente as questões básicas do trabalho escolar [...] discussão que só terá sentido se vinculada à análise histórico-social da escola e de sua função política numa sociedade de classes.

- melhoria da qualidade de ensino através de currículos adequados, conteúdos articulados com a realidade social [...] qualificação docente, administração colegiada entre outros.
- fortalecimento da administração colegiada, com a participação da comunidade, para efetiva democratização das decisões tomadas na escola.

- valorização do profissional do magistério, com garantia de salários justos e jornada de trabalho compatível com as necessidades de sua função.

- revisão nos critérios de promoção que devem se basear no efetivo desempenho do profissional, constatado através de resultados comensuráveis: realização de cursos de atualização, publicação de trabalhos entre outros.

- reformulação dos cursos de formação de professores, para que possam melhor preparar os docentes, e reciclagem(sic!) obrigatória e constante para aqueles que já estiverem atuando.

- engajamento político-profissional em entidades de classe que visem a defesa de seus interesses.
- ampliação da jornada escolar, de forma que o aluno realize todas as atividades escolares no recinto da própria escola e onde ele possa receber material escolar gratuito, alimentação completa, esporte e lazer.

- expansão ordenada e racional da escola pública para que ela possa atender a toda a população escolarizável, em todos os níveis.

- construção de prédios adequados que possam atender às necessidade de todos os serviços da escola: administrativo, pedagógico, esportivos, culturais e de lazer.(PRAIS, 1990, p.79-80).

Alguns aspectos são essências 
na efetivação da função da escola pública:

- a administração colegiada pode ser entendida como fenômeno educativo, pois “propicia a vivência democrática para a participação social e o exercício da cidadania” (PRAIS, 1990, p.82). E continua,
a administração colegiada, ao se efetivar como prática democrática de decisões, deve ser capaz de garantir a participação de todos os membros da comunidade escolar, a fim de que assuma o papel de co-responsáveis no projeto educativo da escola, e, por extensão, na comunidade social [...] é na prática que se gesta a consciência. Assim, através da prática da administração colegiada, a comunidade escolar vivencia situações de cidadania próprias da dinâmica social e do papel do cidadão nessa dinâmica (PRAIS, 1990, p.82).
- a administração colegiada contribui para a recuperação da função da escola pública enquanto popular, pois a democratização das relações exige que a comunidade participe das decisões a respeito da proposta educativa a ser concretizada, visto que a administração colegiada se firma na decisão coletiva. Segundo Prais (1990, p.84), “o educador não esgota seu papel na transmissão e elaboração do saber sistematizado, cabendo também a ele preparar a classe trabalhadora para assumir o papel de classe dirigente, antes de tornar-se governante”. Assim, a administração colegiada torna-se instância de mediação de uma prática pedagógica e política.

- a administração colegiada tem sentido político, no contexto de uma concepção democrática de administração, como participação co-responsável, que favorece a experiência coletiva ao efetivar a socialização de decisões e a divisão de responsabilidade. “A participação constitui-se, pois, em elemento básico de integração social democrática. Participação e democracia têm assim uma significação indissociável” (PRAIS, 1990, p.84).

E continua, “ao se firmar como prática política essencialmente democrática, a administração colegiada preocupa-se em instituir uma forma de organização escolar que supere os conflitos através da síntese superadora resultante das convergências e sintonias dos diferentes grupos que integram a escola, através da participação coletiva”.

- a administração colegiada recupera a significação da tarefa do diretor de escola enquanto líder do processo educativo, dando-lhe condições de compatibilizar as exigências burocráticas-administrativas das instâncias superiores do sistema escolar com o conteúdo educativo a ser desenvolvido no interior da escola, conciliando a competência técnica à clareza política, numa coordenação que possibilite aos interesses coletivos sobrepujarem os individuais.

- explicitação do sentido da proposta de eleição do diretor de escola, a qual, por si só, não é sinônimo de democratização escolar, pois deve se considerar a maneira como será exercida esta função, que assume dimensão de responsabilidade política em equilíbrio com a competência técnica, o que exige que o provimento do cargo obedeça a critérios de civilidade e legitimidade.

Ainda para Prais (1990, p.58), “o colegiado constitui-se portanto num instrumento de ação coletiva nas escolas estaduais, devendo ser entendido não apenas como auxiliar de direção, mas como órgãos de tomada de decisões em todos os níveis, para que o exercício da democracia possa ser viabilizado também nas escolas”. E continua, “colocada nestes termos, a administração colegiada exige uma nova organização na escola e um novo compromisso por parte de todos os seus integrantes.

Compromisso que requer a participação de toda a comunidade escolar nas decisões do projeto educacional da escola”(p.60).

Diante dos fatores expostos, espera-se clarificar a reflexão “do como, porquê e para que a administração colegiada pode ser considerada como um fator de combate à seletividade, discriminação, desqualificação e fragmentação do trabalho escolar” (PRAIS, 1990, p.87).
Para Rodrigues (apud PRAIS, 1990, p. 63),
O colegiado constitui-se em um projeto que devemos assumir para a construção de uma ‘nova escola’. Não devemos esperar, ingenuamente, que a sua simples instalação produza, de imediato, todos os efeitos práticos e políticos esperados. O caminho para a mudança será construído e reconstruído no dia-a-dia, à medida que vamos compreendendo os problemas educacionais.
Prais (1990, p. 77), correlaciona a administração colegiada com a prática pedagógica, aspecto fundante do projeto político-pedagógico, como
prática que, efetivando a co-gestão e o diálogo, propicie a oportunidade de um repensar contínuo da prática pedagógica, procurando efetivá-la de forma qualitativamente adequada à realidade e à época atual [...] uma administração que oportunize a troca de experiências, conhecimento da realidade, uma prática colegiada de decisões, estaria comprometida com a busca de uma Proposta Pedagógica adequada ao momento atual [...] acredito que através de um administração e de um corpo docente arrojado, comprometido e conhecedor dos fundamentos desse tipo de administração, a prática pedagógica seria qualitativamente adequada à realidade atual, pois estaria propiciando condições de se atender aos reais interesses das camadas populares.
PRAIS, Maria de Lourdes Melo. Administração Colegiada na Escola Pública. 2.ed. Campinas, SP: Papirus, 1990. 110 p. (Coleção Magistério: formação e trabalho pedagógico).

04/06/2018

GESTÃO PEDAGÓGICA – UM RELATO - A REALIDADE DE UMA DIRETORA DE ESCOLA

Maria Ângela P. R. Innocente
Em 1998 assumi a Direção da EE José Gabriel de Oliveira. Já atuava na Educação desde 1985, porém como professora, no Ensino Médio, na rede estadual, regular e suplência, em escola particular e no ensino técnico (rede Paula Sousa - CEETEPS), e também como coordenadora pedagógica. Não tinha qualquer experiência em direção de escola.
Esta escola, instalada em 1913, em Santa Bárbara D'Oeste, jurisdicionada à Diretoria de Ensino - Região de Americana, contava com classes de quinta a oitava séries, do ciclo II do Ensino Fundamental, distribuídas igualmente nos períodos da manhã, tarde e noite.
Vou descrever a seguir, algumas ações desenvolvidas em 1999 e em 2000.
Embora fosse uma escola organizada, com módulo de funcionários completo, meu diagnóstico foi a não existência do "coletivo" na escola e tampouco de uma linha de trabalho docente. A participação da comunidade era pequena, assim como a dos alunos. Os alunos tinham 63 origens diferentes, pois, apesar de ser uma escola central, a clientela do entorno era pequena, recebendo, portanto, alunos dos mais diversos bairros, inclusive da zona rural. Os professores praticamente desconheciam o Projeto Político-Pedagógico da escola, bem como não se interessavam em discutir o Regimento Escolar, que estava em processo de elaboração, nem sequer em discutir as normas de gestão e convivência, que constariam deste.
No Planejamento, juntamente com os professores, optamos por mudar este quadro. Assim, começamos a realizar algumas ações para tal.
Durante o planejamento, assistimos ao filme "Jamaica abaixo de zero", discutindo a importância do trabalho coletivo. Depois, contatei alguns colegas de profissão que pudessem socializar suas experiências com os professores e, reunidos por área, discutimos, por exemplo, o uso do teatro como instrumento de aprendizagem e a utilização da metodologia de projetos, entre outros aspectos. Também discutimos e elaboramos uma outra maneira de registrar os Planos de Ensino, de forma que, primeiro os professores se reuniram por disciplina, depois por área de conhecimento e finalmente, com o grupo-escola, de forma a propor os projetos a serem desenvolvidos durante o ano e decidir no coletivo quais seriam estes, quem seriam os responsáveis, as datas de finalização e como chamaríamos os pais a participar da apresentação dos produtos finais destes.
Em seguida, organizamos as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivas (HTPC) de forma a proporcionar o estudo dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que ainda eram praticamente desconhecidos pelos professores. Isto foi feito montando-se um cronograma de apresentação dos PCNs, pelos professores de determinada disciplina, aos demais. Após esta etapa de troca de conhecimentos, passamos a utilizar as HTPC para a troca de experiências bem sucedidas em sala de aula, também com um cronograma de apresentação dos professores de cada disciplina aos demais.
Destas ações, surgiu a ideia de trabalhar inter/transdisciplinarmente todas as áreas com o tema "Brasil" (embora o aniversário do descobrimento fosse somente no ano seguinte). Conquanto não seja possível aqui descrever tudo que foi feito, alguns produtos obtidos foram: em História, dança e teatro sobre a semana de Arte Moderna; em Artes e Educação Física, dança e teatro utilizando o tema das histórias infantis de Monteiro Lobato; em Ciências, os costumes de alimentação do povo brasileiro, trabalhando valor nutricional e custos (já integrando com Matemática), com um café da manhã coletivo preparado pelos alunos, bem como a preservação do meio ambiente (integração com Geografia), exposta através de murais referentes a trabalhos de campo realizados no entorno da escola; Matemática também trabalhou com formas geométricas, área e perímetro, através da horta feita na escola e também do tema "Folclore", com um concurso de pipas. Também trabalhamos o civismo, realizando eleição de bandeira para a escola, e este desenho passou a ser estampado na camiseta de uniforme da escola, no ano seguinte.
Os concursos tinham como premiação a entrega de medalhas, em ato público. E a "apoteose", foi a apresentação no Teatro Municipal (lotado), da peça desenvolvida pela professora de Língua Portuguesa, auxiliada pela de Artes, com alunos do noturno, com o título e tema "500 anos da Literatura Brasileira", que foi aplaudida de pé pelos presentes e que ajudou a encaminhar alguns dos alunos participantes para a carreira teatral, para a capoeira e elevando sua auto-estima, o que também resultou na melhoria da aprendizagem.
Num segundo momento, conseguimos a presença dos músicos dos instrumentos de corda da Orquestra Sinfônica Municipal de Americana, para apresentação, no pátio da escola, de obras de Villa-Lobos. O coral da escola, cuja instrutora era paga pela Prefeitura, também apresentou músicas folclóricas brasileiras. E ainda conseguimos aumentar a participação dos alunos na Fanfarra da escola, cujo instrutor também era pago pela Prefeitura, reformando os instrumentos que estavam danificados, e fizemos brilhante apresentação no desfile de 7 de setembro, com os alunos sendo acompanhados por pais, funcionários, professores e direção; tendo as balizas sido ensaiadas pela professora de Educação Física.
Fizemos uma parceria com a LATASA S/A, para reciclagem de latas de alumínio, as quais eram entregues na indústria, em São Paulo, bimestralmente, por um pai "Amigo da Escola", e trocadas por objetos de interesse da escola (decididos junto com alunos e professores e os colegiados), dependendo da quantidade arrecadada, como bolas, aparelho de som, mesa de ping-pong, e outros.
É lógico que tudo foi muito trabalhoso, envolveu custos, e por isso, além de contar com verbas públicas para manutenção da escola, fizemos uma Festa Junina e uma Festa da Primavera (estas festas passaram a fazer parte do calendário da escola, porém não somente com o intuito de arrecadação de fundos, mas sempre utilizando-nas para atrair os pais a verem os produtos finais dos projetos desenvolvidos na escola, que eram apresentados nestas ocasiões); emprestamos móveis para o cenário da peça; conseguimos o teatro gratuitamente, em parceria com a Prefeitura Municipal, que também nos cedeu os técnicos para a utilização do som e da iluminação, bem como de mães que costuraram os figurinos, não só no teatro, como nas demais apresentações, e o envolvimento de toda a equipe escolar, incluindo os funcionários no planejamento das ações, para que entendessem o propósito pedagógico de tudo aquilo, e não vissem como "bagunça que dá trabalho para limpar".
Estas arrecadações também nos permitiram colocar uma tela de proteção sobre a quadra da escola, pois, apesar de ter alambrados, muitas bolas os ultrapassavam e eram perdidas ao cair na rua. Ainda conseguimos comprar um computador para o trabalho na secretaria e alguns “cd-roms” escolhidos pelos alunos.
Falando em “cd-roms”, tomamos o cuidado de utilizar parte das HTPCs para capacitar os professores no uso da informática, pois na época a escola contava com Sala Ambiente de Informática (SAI), com cinco computadores. Também fizemos uma parceria com uma escola de informática vizinha da escola, que se propôs a capacitar os professores, fora de seu horário de trabalho, mediante adesão destes. Para a utilização desta sala, bem como sala de vídeo, que deveriam ser reservadas com 48 horas de antecedência, elaboramos uma ficha de reserva de uso, onde constavam os temas a serem trabalhados, os objetivos, data, horário, etc. Além disto, enviamos ofícios a escolas técnicas de informática da região, oferecendo estágio na área, sem remuneração, mas podendo oferecer o vale-transporte, custeado pela APM. Como eram poucos computadores, os alunos trabalhavam em duplas ou trios, dividindo-se a classe em dois grupos, um ficava na sala de aula com o professor e o outro na sala de informática com o estagiário (às vezes fazíamos de forma diferente), invertendo-se os grupos na aula seguinte.
Outras ações que promovemos foram: montamos um álbum da escola, com fotos de todos os eventos e reportagens publicadas nos jornais da cidade, alusivas a estes (passamos a tentar divulgar todas as coisas boas que aconteciam na escola); divulgação das reuniões de pais na imprensa escrita e falada (o que foi conseguido por intermédio do Grêmio Estudantil); troca das cortinas das salas de aula e da secretaria; reformas de banheiros, cozinha, despensa, esgoto,arquibancada, pisos, pintura,laboratório de ciências; aquisição de vidrarias para este laboratório; aquisição de balança antropométrica; readequação do espaço e mobiliário para sala de leitura; construção de mesas de alvenaria sob árvores, constituindo nossa sala de leitura ao ar livre; participação em projetos da Secretaria da Educação Municipal; implementação de programa de prevenção ao uso de drogas, em parceria com o “Amor Exigente” e outras instituições, realizando palestras e outras ações na escola; dinamização do uso das salas-ambiente (neste ponto, o sucesso não foi absoluto, mas iniciamos o processo); participação em ações de solidariedade, como arrecadação de alimentos – no final de 2000, vencemos o concurso de árvores de Natal, realizado pela prefeitura, com uma árvore montada com sacos de arroz, que foram depois doados.
O envolvimento dos pais fez que viessem à escola para assistir às apresentações dos produtos finais, participassem das festas celebradas e, principalmente, se conscientizassem que não é só em sala de aula, com giz, lousa e exposição do professor, que o aluno aprende.
Este envolvimento fez também que, além dos pais participarem dos eventos, passassem a participar das reuniões de pais, das Assembléias de APM e do Conselho de Escola, permitindo uma gestão mais compartilhada.
Na primeira Assembléia anual da APM, os pais foram esclarecidos sobre quais verbas a escola recebia, qual sua possível utilização (inclusive utilizamos transparências), o porquê da necessidade de contribuição para a APM; passamos para todos os pais presentes diversas prestações de contas, para os pais saberem como eram feitas. Os balancetes mensais sempre foram expostos em mural em frente à secretaria e no pátio da escola, para ciência de todos.
Outra providência tomada foi a implementação de uma "cultura de avaliação", pois tudo que era feito, também era avaliado e redimensionado, se necessário, e, no final do ano, fizemos, por escrito, uma avaliação da escola com todos os pais, inclusive para que indicassem quais projetos/atividades gostariam que realizássemos na escola no ano seguinte, qual o melhor horário para reunião de pais e outras ações que julgassem necessárias.
Também dinamizamos a participação dos alunos nos Conselhos de Classe/ Série, através da presença neste de dois representantes de classe, eleitos entre seus pares, discutindo a atuação no processo de aprendizagem, tanto dos alunos, como dos professores.
Outrossim, readequamos a ficha individual de acompanhamento dos alunos e elaboramos uma ficha para acompanhamento coletivo da classe. Os problemas elencados nesta ficha, como indisciplina, falta de interesse e participação, grupos que atrapalhavam o andamento da aula, por exemplo, eram encaminhados já na semana seguinte ao Conselho de Classe/Série; os alunos eram chamados para conversar com a coordenação, direção ou seus pais eram convocados, dando ao professor uma segurança de que os problemas não ficariam sem solução, fazendo-os sentir o apoio da direção.
O Grêmio Estudantil, eleito nesta gestão, foi sempre chamado a participar de tudo, assim indo além da organização de torneios, mas, principalmente, estando presente às reuniões de Conselho de Escola e da APM, podendo opinar nas decisões dos rumos da escola. O Grêmio também se responsabilizou pela apresentação de músicas e textos durante os intervalos dos períodos.
Ainda abrimos espaço, sob programação prévia, para a "Mostra de Talentos" dos alunos da escola, com apresentação, nos intervalos, dos grupos musicais de alunos da escola, com diferentes gêneros musicais. Este espaço também foi utilizado para a socialização de atividades bem sucedidas em sala de aula.
Uma outra ação foi, uma vez por semana, em dias e horários alternados, todas as classes da escola discutirem um tema relacionado ao tema "Ética e Cidadania". Também, nesta mesma organização, cantávamos o Hino Nacional e hasteávamos a Bandeira Nacional, e ainda, fazíamos um projeto de preservação do patrimônio, com a participação dos alunos na limpeza dos tampos das carteiras.
Fizemos ainda um projeto, com a participação de diversos professores, de pintura interna dos muros da escola, cada classe recebendo um "pedaço" do muro para pintar (compramos tinta com verbas estaduais), com o tema "Preservação da Água"; este projeto não chegou a ser concluído, por ser perto do final do ano, preço das tintas e troca de professores, que não deram continuidade à ideia.
Claro que nada disso seria possível sem o engajamento da coordenação pedagógica, da vice-direção, professores, funcionários, alunos, pais, parceiros, pois, já dizia o ditado "uma andorinha não faz verão".
Também é claro que tivemos problemas de disciplina e outros, como evasão na quinta série do período noturno (que, infelizmente, não conseguimos solucionar), que fomos resolvendo junto com o grupo, à medida que surgiam. Na avaliação do SARESP que classificou as escolas em cores, a escola recebeu a classificação "verde".
A escola foi indicada para concorrer ao Prêmio Gestão Escolar, pela Diretoria de Ensino, entre outras cinco.
Fui diretora da escola de julho de 1998 a janeiro de 2001, quando fui para a Supervisão de Ensino, função que exerço atualmente, mas ainda penso ser importante esta socialização de algo que "deu certo" e ainda hoje, de alguma forma tem continuidade, talvez não para todos que ainda estão nesta unidade escolar, mas pelo menos para os que acreditam que o ensino de qualidade é possível.

21/05/2014

A QUESTÃO DA DESCENTRALIZAÇÃO

 

Os anos 1980 marcaram uma abertura política no país. Este período se destaca pelo início da construção da chamada cidadania política, que transcende a democracia representativa, aproximando-se da democracia participativa, como nova alternativa ao exercício político. Passa-se a entender a democratização como real participação da sociedade civil nas discussões públicas.

A questão da descentralização passa a ser discutida e a partir da Constituição (1988) a descentralização apresenta-se como palavra de ordem no setor político e administrativo.

Assim, a descentralização caracteriza-se como exigência histórica para a consolidação da democracia no país.

Porém, nos dizeres de Abranches (2003, p.13),

é preciso considerar que o termo descentralização está sempre carregado de conotações positivas, mas, como todo instrumento de ação governamental, não possui qualidades exclusivamente precisas [...]; se de um lado pode representar um mecanismo de participação que permite o retorno do poder à sociedade civil, por outro, pode caracterizar-se como uma forma de reforçar o aparelho de dominação, encobrindo uma relação autoritária.

A discussão em torno da descentralização a coloca em contato com vários outros conceitos – democracia, autonomia, participação (plano político), desconcentração, prefeiturização, municipalização (plano administrativo).

Cabe uma reflexão sobre a descentralização como estratagema estimulado pelas políticas neoliberais, amparadas pelo discurso da modernização, visando diminuir a ação estatal na área do bem-estar social, a fim de reduzir despesas.

Segundo Stein (1997 apud ABRANCHES, 2003, p.14) a intenção do processo de descentralização é “neutralizar as demandas sociais, desconcentrando os conflitos e envolvendo a população na busca de soluções para seus próprios problemas”.

Por outro lado, outras propostas de descentralização têm o objetivo de ampliar a esfera pública envolvendo o Estado e a sociedade civil.

Desta forma, a descentralização pode ser analisada sob dois aspectos: ligada às discussões sobre as ações governamentais e/ou associada às ações participativas da sociedade civil nos assuntos públicos

Podemos então conceituar descentralização como transferência de autoridade legal e política, que se liga a um princípio de reforma do Estado, numa nova relação deste com a coisa pública e com a sociedade civil.

Pensamos então a descentralização como um instrumento de ação para o desenvolvimento político da sociedade. Desta forma, pressupõe a existência da democracia, da autonomia e da participação.

Algumas pré-condições devem existir para que a descentralização viabilize processos de participação popular, como o acesso às informações necessárias para a gestão, a garantia de assento aos segmentos menos poderosos da sociedade na composição de conselhos diretivos, a transparência dos processos de gestão e tomada de decisões.

Segundo Campos (1997 apud ABRANCHES, 2003, p.22), “a viabilização de um ordenamento político/institucional/democrático está diretamente associada à participação da sociedade civil no processo de concepção e gestão das políticas públicas”.

Em decorrência disso, segundo Gohn (1990 apud ABRANCHES, 2003, p. 22), “a nova estrutura de poder irá colocar em crise as atuais políticas públicas, suas propriedades, seus mecanismos de elaboração e de controle. Uma nova estrutura estatal poderá surgir dos conselhos, articulando a democracia representativa e a democracia direta”.

Pode-se garantir a participação pelas experiências colegiadas, e outras vivências que propiciem amadurecimento das relações sociais e uma atuação mais política dos indivíduos.

Para Arendt (apud ABRANCHES, 2003, p. 25) é importante o resgate do espaço político e a inserção dos indivíduos no espaço público, o que pode auxiliar na compreensão da dinâmica da participação, pois proporcionam uma democracia participativa.

Nos dizeres de Marodo e Simon (in OLIVEIRA, 2001, p. 144), poderiam ser distinguidos quatro tipos de descentralização: a desconcentração (delegar responsabilidades administrativas a níveis inferiores dentro das agências centrais), a delegação (transferência de responsabilidades a organizações que estão fora da estrutura burocrática), a devolução (transferência a unidades de governo subnacional fora do controle direto do governo central) e a privatização (transferência de responsabilidades ao setor privado).

Esses autores nos mostram ainda alguns problemas recorrentes na descentralização:

- motivação financeira da transferência;

- falta de diagnósticos prévios e de projeto educativo orientador;

- ausência de administradores qualificados nas jurisdições para cumprir funções ampliadas, mais complexas e qualificadas, o que pode levar à deterioração dos serviços;

- ausência de tecnologias necessárias para a gestão;

- ausência de dados em relação ao sistema educativo para tomada de decisões de política educativa;

- modelos de gestão provincial inspirados nos de nível nacional – os processos de decisão não incluem majoritariamente mecanismos de participação, o que dificulta a necessária democratização da gestão;

- quebra do movimento sindical docente;

- a descentralização não significa maiores níveis de democratização do sistema nacional de educação.

Embora referenciados à Argentina, parecem-nos semelhantes ao que ocorre no Brasil.

Segundo Rosar (in OLIVEIRA, 2001, p. 113), “a descentralização pode significar a possibilidade de aumentar a participação não dos indivíduos em geral, mas de determinados indivíduos e grupos”, o que pode garantir a hegemonia dos grupos que detém o controle. Em outros casos, “alguns grupos que estão no governo insistem no fomento de políticas de descentralização porque seus interesses estariam sendo resguardados, reduzindo-se o poder de outros grupos que também estão no governo”. Desta forma, “os grupos que detêm o poder utilizam estratégias de centralização ou de descentralização na medida em que resguardam seus interesses”.

Nos alerta Licínio Lima, em trabalho realizado em Portugal, a respeito de descentralização e autonomia:

Sempre que essencialmente apoiadas/legitimadas por razões de ordem técnica e instrumental, a descentralização e a autonomia são despojadas de sentido político democrático-participativo e são frequentemente transformadas em instrumentos e técnicas de gestão, tantas vezes ao serviço de políticas de signo contrário. Não é seguramente por acaso que as questões da descentralização e da autonomia passaram a constituir temas centrais nas políticas educativas de feição neoliberal, reconceptualizadas por forma a apoiar a recentralização política que tem ocorrido em diversos países (1997, p.8 apud ADRIÃO, 2001, p. 160).

Torna-se necessário desvelarmos o sentido político das perspectivas descentralizadoras e de valorização da autonomia escolar, para que não apoiemos iniciativas centralizadoras e padronizadoras da atividade pedagógica, em nome da defesa da presença do Estado na manutenção da educação.

Nos dizeres de Dalila Oliveira,

A autonomia não se limita às questões de ordem administrativa e financeira, revela também a possibilidade de uma escola criar ou definir o seu projeto pedagógico, por isso é antes de tudo política. A descentralização, comumente designada de autonomia administrativa e financeira, expressa um movimento de atribuir maior mobilidade administrativa às unidades escolares, uma vez que retira certas responsabilidades da União, dos Estados e/ou dos Municípios e as repassam às escolas diretamente (1995, p.6 apud ADRIÃO, 2001, p. 188).

Descentralização torna-se pré-condição para a autonomia política e pedagógica da escola, para que esta tenha poder decisório.

Percebe-se que, para as escolas subordinadas à SEE, a descentralização dos poucos recursos financeiros aliou-se ao aumento da responsabilização pelos resultados – evasão, retenção, Saresp, parcerias (captação de novos recursos).

Logicamente que, subordinando-se a um conjunto de regras legal, não há como dizer que existe autonomia irrestrita (é sempre relativa). Porém parece haver desconfiança dos órgãos centrais em relação à própria escola, como capaz de elaborar/construir, executar/gerir/acompanhar e avaliar seu próprio projeto político-pedagógico.

Autonomia, numa perspectiva democrática, articula-se a mudanças de natureza política, que pressupõem mudanças na organização e no financiamento do Estado, o que levaria à necessidade de descentralizar a ação governamental, ampliando a participação dos usuários e educadores na definição e avaliação da política educacional, possibilitando decisão local para a gestão do projeto político-pedagógico da escola.

Referências:

ABRANCHES, Mônica. Colegiado Escolar – Espaço de participação da comunidade. São Paulo: Cortez, 2003. 110 p. (Questões da Nossa Época 102)

ADRIÃO, Theresa Maria de Freitas. Autonomia Monitorada como eixo de mudança: Padrões de gestão do ensino público paulista (1995-1998). 2001.202 f. (Tese de Doutorado).USP, SP, 2001.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2003.

OLIVEIRA, Dalila Andrade (org.). Gestão Democrática da Educação – Desafios Contemporâneos. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.

20/05/2014

EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE E TEMAS AFINS

 

Educação

EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE E TEMAS AFINS
Artigos, Resenhas, Resumos e Textos

Os textos de Educação na Contemporaneidade e temas afins – Artigos, resenhas, resumos e textos apresentam possibilidades de reflexão sobre temas relevantes da Educação e seus correlatos, situando-os na sociedade contemporânea, visando levar o leitor a informar-se de forma crítica.

O livro compõe-se de três partes:
I. Artigos, alguns produzidos com finalidade explícita de publicação, outros como trabalho acadêmico no Mestrado em Políticas da Educação e Sistemas Educativos na FE/UNICAMP, e ainda outros pelo prazer do estudo e da discussão de alguns temas. A formatação dos artigos não seguiu rigidamente as Normas ABNT, uma vez que foram adequados ao formato de livro;
II. Resenhas e resumos, com as mesmas características que levaram à elaboração dos artigos;
III. Outros textos, que foram produzidos durante a trajetória da autora como educadora.

Foram ainda acrescentados alguns artigos e resenhas elaborados durante cursos de Pós-Graduação, de outras autorias.

 

Scortecci Editora - Animais - Formato 14 x 21 cm - 2ª edição - 2013 - 104 páginas

Para adquirir este livro acesse minha Loja Virtual.

Veja o álbum completo deste evento clicando aqui.

SAM_4624

SAM_4645

SAM_4639

SAM_4644

SAM_4637

SAM_4631

19/05/2014

RESENHA: IDEOLOGIAS EM CONFLITO: ESCOLA PÚBLICA E ESCOLA PRIVADA[1]

 

À época em que o livro foi editado, a autora era Professora de História da Educação com Mestrado na área de Filosofia da Educação na Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), concluído em 1975 e encontrava-se cursando o Doutorado na Universidade de Paris (Sorbonne).

Na obra, descreve-se o conflito escola particular-escola pública, durante a tramitação do projeto de lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 4024/61, utilizando-se para tal de publicações da época, e analisando as ideologias subjacentes aos grupos defensores de cada lado do conflito. É feita também uma análise das raízes históricas dessas ideologias, que se manifestaram no período estudado, o quinquênio 1956-1961.

Nesse livro, cujo trabalho foi originalmente apresentado como dissertação de Mestrado, a autora começa por demonstrar o divórcio existente, no Brasil, entre o plano das ideias (posições teóricas, propostas de reformas, objetivos proclamados) e o plano das instituições (estrutura escolar, modo de funcionamento, objetivos reais), fator pelo qual acredita não existir um sistema educacional no país, e investiga o porquê.

Para explicar a ausência de sistema educacional no Brasil, mostra como uma das hipóteses as posições ideológicas dos diferentes grupos que participam do conflito escola particular-escola pública, utilizando como referência a obra de Dermeval Saviani, Educação Brasileira: estrutura e sistema.

Distinguem-se, do lado da escola pública, pelo menos três posições: os liberais-idealistas, os liberais pragmatistas e os de tendência socialista; do lado da escola particular estavam a Igreja Católica e os donos de escola particular que se apoiavam na doutrina da Igreja para defender seus interesses.

A autora indaga:

- quais as notas distintivas das posições ideológicas para a não existência de sistema educacional brasileiro?

- que condições históricas tornaram possível o seu aparecimento e desenvolvimento?

A autora pretende responder à primeira indagação caracterizando as diferentes ideologias formuladas pelos seus porta-vozes, através dos documentos disponíveis. Já, em relação à segunda, pelo exame do contexto histórico em que se deu.

O pano de fundo é a tramitação do projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, cujas polêmicas se iniciaram em novembro de 1956 e terminaram em 1961, com a aprovação da Lei 4024/61, período em que analisou as publicações relacionadas diretamente ao assunto em questão.

No texto, mostra-se que, tanto os que defendiam a escola pública, quanto os que defendiam a escola particular, o faziam em nome da liberdade de ensino, embora essa liberdade fosse entendida de forma diferente pelos dois grupos.

Situando a questão, mostra-se inicialmente que, utilizando a competência da União em legislar sobre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o General Dutra, Presidente da República, enviou ao Congresso Nacional, em outubro de 1948, um projeto de lei sobre o assunto, de orientação liberal, onde constava “a educação nacional inspira-se nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana”.

Encaminhado ao Senado, o relator, deputado Gustavo Capanema, emitiu Parecer que paralisou a tramitação do Projeto, e só aproximadamente seis anos depois se iniciaram os debates na Câmara. Havendo um novo projeto-sugestão, de Lauro Cruz, inicia-se a mudança nos rumos da tramitação deste, mudando de um conflito entre a centralização e a descentralização da educação brasileira, para a combinação desta última com os interesses privados, conflito que, em 1956, irrompe abertamente entre escola particular-escola pública.

Na parte seguinte da obra, a autora se dedica a analisar os conflitos, nas diferentes publicações no período, entre os defensores da escola particular e os defensores da escola pública, sendo que, nesse caso, a escola particular é considerada como escola confessional. Ao conflitos, após debates entre Fonseca e Silva (escola particular) versus Anísio Teixeira (escola pública), se alastram pela imprensa. Anísio Teixeira e Florestan Fernandes, que também se envolve no debate, passam a ser alvos de ataques pessoais a seus posicionamentos político-ideológicos, nem sempre bem interpretados. Estes se utilizam de publicações de artigos na imprensa para a defesa de suas posições. O debate se centra no diferente entendimento que se dá à liberdade de ensino, visto que os defensores da escola pública se pautam por uma educação laica, pública e gratuita, enquanto que os defensores do ensino confessional/particular, se utilizam do conceito de liberdade como o direito da família na escolha da escola para seus filhos, que deveria, se necessário, ser custeada pelo Estado, visto que este não tinha o direito de se sobrepor ao direito da família à educação de seus filhos. Os defensores da escola pública eram considerados como tendo a intenção de implantar o socialismo no Brasil, “promovendo não só a laicização do ensino, mas também a laicização e o materialismo da vida[...], um plano de orientação materialista e ateísta do ensino nacional[...] em favor do monopólio estatal”.

Nessas discussões, manifestos surgem na imprensa, como o Manifesto dos Educadores, contra a possibilidade de utilização dos recursos públicos para manterem instituições privadas, e outros grupos, exprimindo pontos de vista divergentes, recorrendo a argumentos dos direitos da família e da Igreja.

Carlos Lacerda, em seu substitutivo ao Projeto de Lei de Diretrizes e Bases, agrada aos defensores da iniciativa particular em Educação, pois neste institui a liberdade de ensino, entendida no sentido dado pelas correntes privatistas, o que leva à rejeição pelos defensores da escola pública. No entanto, o substitutivo leva à intensificação dos debates sobre a questão escola particular-escola pública.

Em setembro de 1959, a Comissão de Educação e Cultura da Câmara Federal apresentou um substitutivo, que surge com redação final em dezembro desse ano, aprovado pela Câmara em janeiro de 1960, onde prevalece a orientação privatista, o que leva à intensificação da luta pelos defensores da escola pública, tentando que este não fosse aprovado no Senado, o que também aumentou o volume de publicações sobre a questão e também as manifestações estudantis.

Percebe-se então, dos debates, que as duas correntes defendiam a liberdade de ensino, porém a viam em diferentes concepções.

Para Wilson Cantoni, “a política básica da educação pública e leiga é garantir ao máximo a liberdade de consciência, que é considerada como a condição indispensável para a liberdade de pesquisa e de ensino, pois é a liberdade de pesquisa e de ensino que vai garantir o progresso do conhecimento[...] a escola pública e leiga é a única que, por força de seus próprios princípios básicos, garantirá a plena realização das possibilidades humanas do homem, desde que aceitamos a busca integral de consciência e pesquisa como seu corolário indispensável”.

Já para os defensores da iniciativa privada, a liberdade de ensino é identificada como liberdade de escolha por parte do indivíduo da escola que quer frequentar, considerando que a não possibilidade da referida escolha configura-se como monopólio estatal, totalitarismo, “num postulado socialista e diabólico, que cerceia as opiniões da família e subordina o indivíduo à prepotência do Estado...”

Numa última etapa de tramitação do Projeto de Diretrizes e Bases, organizou-se um movimento a partir de São Paulo,que se irradiou para outras regiões do país, pela defesa intransigente da escola pública, que teve como um dos frutos a realização da I Convenção Estadual em Defesa da Escola Pública, em maio de 1960, da qual saiu a Declaração de Princípios e onde foram apresentadas em plenário cinco comunicações, enfocando diferentes aspectos do tema.

Outros documentos em defesa da escola pública também foram redigidos, por exemplo, por Laerte Ramos de Carvalho, João Eduardo Villalobos, Fernando Henrique Cardoso, Roque S. M. Barros, dentre outros, que, embora às vezes por diferentes motivos, estavam irmanados na luta pelo mesmo objetivo.

O professor Florestan Fernandes, numa análise crítica do projeto de lei aprovado pela Câmara Federal, salienta que “o legislador sucumbiu às pressões reacionárias e conservantistas, contribuindo legalmente para a manutenção da estrutura da sociedade e a posição dentro dela, das camadas dominantes”.

Assim, diferentes correntes ideológicas (liberais-idealistas, liberais- pragmatistas e socialistas), por diferentes motivos, se unem em defesa da escola pública, enquanto que os proprietários de escolas particulares, sem terem ideologia própria, unem-se em torno da ideologia da Igreja Católica.

Em junho de 1961, o Projeto sobre Diretrizes e Bases da Educação, aprovado pela Câmara dos Deputados, entrou em discussão no Senado, onde diversas emendas foram apresentadas, inclusive um substitutivo, mas não foram acatados.

Restava a esperança de veto pelo presidente João Goulart, mas este apenas o fez a alguns artigos, sendo então o projeto de Diretrizes e Bases da Educação Nacional convertido em Lei nº 4024, de 20 de dezembro de 1961, uma lei que os defensores da escola pública não reivindicavam.

Dessa forma, a autora conclui que, da análise do material bibliográfico referente ao conflito escola particular-escola pública, constatam-se diferentes orientações ideológicas, inspirando a ação das diversas pessoas envolvidas no conflito.

Para os privatistas, a bandeira da luta era a liberdade de ensino, entendida como direito de escolha; para os defensores da escola pública, os liberais idealistas entendem que a educação tem por objetivo a afirmação da individualidade, da originalidade, da autonomia ética do indivíduo, enquanto que para os liberais-pragmatistas, a defesa da escola pública se dá por sua maior eficiência e pelo atendimento às necessidades próximas e imediatas do país, enfatizando a realidade social do educando e a prática pedagógica. Já a corrente socialista, representada basicamente por Florestan Fernandes, considera a Educação em suas relações reversíveis com a sociedade, isto é, o homem modifica o meio e é também por ele modificado, numa relação dialética entre teoria e prática.

Após ter identificado e descrito as diferentes ideologias que interferiram no conflito escola particular-escola pública, a autora passa a explicar o significado dessas ideologias, através do exame da realidade histórica em que elas surgiram.

Para tal, serve-se do embate entre capitalismo e socialismo, sem utilizar-se de uma análise economicista, não os considerando apenas enquanto sistemas de produção.

Situa o período analisado, no qual se dá a consolidação do processo de industrialização, num modelo de substituição de importações.

Faz-se uma retomada do surgimento do capitalismo, a partir da Idade Média, descrevendo-o em suas transformações, nas diversas fases históricas – capitalismo mercantilista, capitalismo liberal ou concorrencial, capitalismo monopolista ou neocapitalismo(no qual se consolida o processo de industrialização brasileiro no período de 1956-1961, orientado fundamentalmente pela substituição de importações, considerado de forma associada ou dependente).

Focaliza as características brasileiras da época, como a estratificação social em classes sociais, que têm como importante elemento de mobilidade/ascensão social, a educação escolarizada, o que leva diferentes setores a reclamá-la.

No conflito enfocado, mostra-se que a ideologia liberal é a da classe dominante; assim, “a educação liberal consiste num processo de adaptação às relações capitalistas de produção, adaptação essa que assegura aos filhos da classe dominante as vantagens e privilégios de sua classe e adapta os filhos da classe dominada às condições de exploração a que são submetidos[...] uma educação ‘desinteressada’ para as elites, e um ensino primário mais algumas escolas profissionais para os trabalhadores”.

Em relação à ideologia da Igreja, no desenvolvimento da civilização ocidental, através do sistema socioeconômico capitalista, esta, não detentora dos meios de produção, coloca-se a serviço da classe dominante, enquanto Aparelho Ideológico do Estado. Essa posição se refere à Igreja enquanto Instituição, podendo existir dissidentes.

No tocante à ideologia socialista, pressupõe-se a negação e superação do próprio regime capitalista de produção, pela “constituição dos proletários em classe, derrubada da supremacia burguesa, conquista do poder político pelo proletariado”.

A autora conclui que no período do conflito, a base capitalista permaneceu a mesma, e a contradição se deu entre o setor moderno e o tradicional, dois modelos, ambos capitalistas, portanto entre dois setores da classe dominante pelo papel principal, o que originou uma LDB conciliatória.

Assim, comprova-se o divórcio entre as ideias educacionais e as instituições escolares brasileiras, cujas bases de divergências ideológicas residem no antagonismo de classes, sendo esses conflitos ideológicos uma das causas explicativas da ausência de Sistema Educacional no Brasil.

Conclui dizendo da necessidade de examinar a hipótese levantada por Saviani, na obra já citada, relativa à estrutura social de classes, que, segundo tudo indica, é a hipótese decisiva para explicar a ausência de Sistema Educacional no Brasil.

Situando o período analisado, de 1956 a 1961, na tramitação da Lei 4024/61, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a autora nos mostra algumas manifestações ideológicas na sociedade capitalista, em que existe o conflito de classes, entre os que detém os meios de produção e os que vendem sua força de trabalho, contextualizando historicamente o Brasil nesse período, e como essas lutas se refletem na educação, não possibilitando a existência de um Sistema Educacional no país, tampouco de uma educação que atenda aos interesses do proletariado.

Percebe-se um esforço da autora na análise documental das publicações da época, procurando situar as posições de figuras e grupos militantes no contexto apresentado, reconstruindo o período analisado e também esclarecendo os referenciais teóricos que utilizou em sua pesquisa.

Num salto analítico, podemos traçar um paralelo entre o período enfocado e o que vislumbramos na atual LDB, Lei 9394/96, pois nos parece que ainda não temos no Brasil um Sistema Educacional e também que, nas discussões da atual LDB, o embate continuou, visto que mais uma vez se aventou a possibilidade do financiamento público (através de bolsas, por exemplo) às escolas confessionais/particulares, bem como a luta da Igreja para incluir o ensino religioso nas escolas, o que, no estado de São Paulo, por exemplo, resultou na inclusão da disciplina Ensino Religioso, de caráter não confessional, nas oitavas séries, do Ensino Fundamental (aulas pagas pelo governo), mas também da possibilidade de, fora do horário regular de aulas, oferecer-se formação confessional, aos alunos que assim o desejarem, porém, até o momento, esta sem ônus para os cofres públicos.

No movimento e no momento atual do capitalismo brasileiro, escola pública e escola privada se apresentam como entidades radicalmente distintas. Ainda que ambas sejam escola, a semelhança institucional não é suficiente para mascarar a distinção essencial entre o interesse público a que uma se destina e os interesses privados a que outra se vincula, embora também, mesmo as escolas públicas estejam inseridas na lógica neoliberal.

Dessa análise, se depreende que, em nossa sociedade de base capitalista, o embate entre as ideologias continua, embora em outro contexto histórico, onde o neoliberalismo e a globalização do capital são o cenário, e as políticas públicas têm caráter mais paliativo que redistributivo.

Na verdade, parece-nos que a questão a fazer é sempre a mesma: escola para quem e para que?

BUFFA, Ester. Ideologias em Conflito: Escola Pública e Escola Privada. São Paulo: Cortez & Moraes, 1979.

Nota:

[1] BUFFA, Ester. São Paulo: Cortez & Moraes, 1979.

Artigo publicado:

Revista HISTEDBR On-line       Número 21 - Março/2006

GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA

 

Ao falar sobre gestão democrática, Paro (1997, p.10), põe “como horizonte a transformação do esquema de autoridade no interior da escola [...], o processo de transformação da autoridade deve constituir-se no próprio processo de conquista da escola pelas camadas populares”.

Na escola atual, existe um sistema hierárquico que coloca, pretensamente, o poder nas mãos do diretor, porém este, como preposto do Estado, em verdade, não tem poder e autonomia, além da precariedade das condições concretas em que se desenvolvem as atividades no interior da escola. Esta falta de autonomia do diretor caracteriza também a falta de autonomia da escola, visto que, conferir autonomia à escola consistiria em dar-lhe “poder e condições concretas para que ela alcance objetivos educacionais articulados com os interesses das camadas trabalhadoras”(PARO, 1997, p.11).

Dividindo-se a autoridade entre os vários setores da escola, conseguindo-se a participação de todos os setores da escola – educadores, alunos, funcionários, pais – “nas decisões sobre seus objetivos e seu funcionamento, haverá melhores condições para pressionar os escalões superiores a dotar a escola de autonomia e de recursos. A esse respeito, vejo no conselho de escola uma potencialidade a ser explorada”(PARO, 1997, p.12).

Segundo Paro (1997,p.17),

“a escola estatal só será verdadeiramente pública no momento em que a população escolarizável tiver acesso geral e indiferenciado a uma boa educação escolar”. Neste sentido, ganha importância a participação da comunidade na escola, com a “partilha do poder por parte daqueles que se supõe serem os mais diretamente interessados na qualidade do ensino”.

No entanto, entendo que a democratização da escola é processo e se faz na prática, visto que “a democracia não se concede, se realiza”(PARO, 1997, p.19).

É preciso que ocorra a transformação na prática das pessoas, enfrentando-se na prática escolar cotidiana as manifestações de autoritarismo, pois todos os que ali atuam têm interesses comuns, visto estarem “desprovidos das condições objetivas de produção da existência material e social e têm de vender sua força de trabalho ao Estado ou aos detentores dos meios de produção para terem acesso a tais condições”(PARO, 1997, p.20).

Inspirada na cooperação recíproca, a administração colegiada

deve ter como meta a constituição, na escola de um novo trabalhador coletivo, que, sem os constrangimentos da gerência capitalista e da parcelarização desumana do trabalho, seja uma decorrência do trabalho cooperativo de todos os envolvidos no processo escolar, guiados por uma ‘vontade coletiva’, em direção ao alcance dos objetivos verdadeiramente educacionais da escola (PARO, 1997, p.160).

PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática da escola pública. São Paulo: Ática, 1997. 119 p. (Série Educação em Ação)

GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO – DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS

 

Nos dizeres de Marodo e Simon (in OLIVEIRA, 2001, p. 144), poderiam ser distinguidas quatro tipos de descentralização: a desconcentração (delegar responsabilidades administrativas a níveis inferiores dentro das agências centrais), a delegação (transferência de responsabilidades a organizações que estão fora da estrutura burocrática), a devolução (transferência a unidades de governo subnacional fora do controle direto do governo central) e a privatização (transferência de responsabilidades ao setor privado).

Estes autores nos mostram ainda alguns problemas recorrentes na descentralização:

- motivação financeira da transferência;

- falta de diagnósticos prévios e de projeto educativo orientador;

- ausência de administradores qualificados nas jurisdições para cumprir funções ampliadas, mais complexas e qualificadas, o que pode levar à deterioração dos serviços;

- ausência de tecnologias necessárias para a gestão;

- ausência de dados em relação ao sistema educativo para tomada de decisões de política educativa;

- modelos de gestão provincial inspirados nos de nível nacional – os processos de decisão não incluem majoritariamente mecanismos de participação, o que dificulta a necessária democratização da gestão;

- quebra do movimento sindical docente;

- a descentralização não significa maiores níveis de democratização do sistema nacional de educação.

Segundo Rosar (in OLIVEIRA, 2001, p. 113), “a descentralização pode significar a possibilidade de aumentar a participação não dos indivíduos em geral, mas de determinados indivíduos e grupos”, o que pode garantir a hegemonia dos grupos que detém o controle. Em outros casos, “alguns grupos que estão no governo insistem no fomento de políticas de descentralização porque seus interesses estariam sendo resguardados, reduzindo-se o poder de outros grupos que também estão no governo”. Desta forma, “os grupos que detêm o poder utilizam estratégias de centralização ou de descentralização na medida em que resguardam seus interesses”.

Segundo Cury (in OLIVEIRA,2001, p. 201),

o termo gestão vem de gestio, que, por sua vez, vem de gerere (trazer em si, produzir), fica mais claro que a gestão não só é ato de administrar um bem fora-de-si (alheio) mas é algo que se traz em si, porque nele está contido. E o conteúdo deste bem é a própria capacidade de participação, sinal maior da democracia. Só que aqui é a gestão de um serviço público, o que (re) duplica o seu caráter público (re/pública).

A gestão democrática na educação, penso, necessita da participação.

Ainda segundo Cury(in Oliveira, 2001, p.205), “a participação como fonte de gestão será tanto direta como no caso de consultas, assembléias, encontros ou mesmo questionário, quanto mediada através de órgãos colegiados como conselhos escolares, conselhos municipais, estaduais e o próprio conselho nacional”.

Numa democracia participativa, “os grupos de pressão e os lobbies substituem os partidos políticos,numa nova forma de controle social e de recuperação de iniciativas autônomas da população trabalhadora, para legitimar o Estado amplo”(BRUNO in OLIVEIRA, 2001, p.39).

A escola é uma das esferas de produção de capacidade de trabalho. Neste contexto, “o custo dessa produção de capacidade de trabalho tem que ser racionalizado, já que para o capital trata-se da produção de uma mercadoria tal como qualquer outra”(BRUNO in OLIVEIRA, 2001, p.39).

Ainda segundo Bruno (in OLIVEIRA, 2001, p.40), “no âmbito interno das escolas, é fundamental promover formas consensuais de tomada de decisões, o que implica a participação dos sujeitos envolvidos, como medida de prevenção de conflitos e resistências que possam obstruir a implementação das medidas consideradas necessárias”.

No caso do processo de trabalho dos educadores, seria a eliminação do que nas empresas se classifica como refugo e retrabalho, o que acresce os custos. “Neste caso, o refugo é o aluno que abandona a escola (investimento perdido) e o retrabalho é o repetente”(BRUNO in OLIVEIRA, 2001, p.41).

Se tomássemos qualidade em educação pela ótica do Banco Mundial, “o retorno econômico constitui o principal indicador da qualidade da educação”(FONSECA in OLIVEIRA, 2001, p.59).

Para este organismo, a educação para todos seria a educação primária, e a educação superior garantiria a seletividade. Os investimentos do Banco Mundial em educação no Brasil, permitiram sua participação na “definição da agenda educacional do país, em consonância com as condicionantes impostas no processo de financiamento externo”(FONSECA in OLIVEIRA, 2001, p.60).

E ainda, segundo esta autora[...] “parcimônia na definição do limite de educação e de saúde para os pobres, que vem camuflada por princípios humanitários, como a Declaração de Educação para Todos, por exemplo”(p. 61).

Continuando,”nesta ótica, a quantidade e a qualidade da educação para os diferentes países são definidas na justa medida do modelo global, isto é, na qual a participação da sociedade local não se faz presente. Assim delimitado, o setor educacional intensifica a sua dependência, em nome de uma concepção técnica e financeira que se anuncia como redentora da pobreza e como guardião da autonomia das nações em desenvolvimento”(FONSECA in OLIVEIRA, 2001, p.62).

Bruno (in OLIVEIRA, 2001, p.44), “que se constituam alternativas práticas possíveis de se desenvolverem e de se generalizarem, pautadas não pelas hierarquias de comando, mas por laços de solidariedade, que se consubstanciam formas coletivas de trabalho, instituindo uma lógica inovadora no âmbito das relações sociais”.

Segundo Rosar (in OLIVEIRA, 2001, p. 132), algumas propostas de capacitação docente que auxiliassem a escola, incluiriam entre outras:

- tornar a escola uma unidade de capacitação para o conjunto da equipe escolar, com assistência técnica dos órgãos descentralizados da administração estadual/municipal/cooperação com a Universidade, deslocando recursos humanos e materiais para a escola;

- sistemas de monitorias ou assistência pedagógica por área curricular, destinado às escolas de uma mesma área, planejados em nível local;

- adoção de materiais para professores, contendo treinamento em conteúdo e metodologia, semelhante à formação à distância, combinado com momentos presenciais;

- criação de oficinas pedagógicas em áreas ou micro-áreas;

- aproveitamento de professores reconhecidamente eficiente e com mais experiência;

- adoção de sistemas de informação simples e de divulgação ágil, de fácil distribuição.

Assim, “todas essas e outras estratégias seriam adotadas, observando-se o princípio de abrir espaços para as iniciativas locais, com o apoio dos técnicos dos órgãos centrais ou das delegacias regionais que seriam ‘animadores’ do processo, procurando fornecer suporte técnico e financeiro para o aperfeiçoamento dessas experiências”(ROSAR in OLIVEIRA, 2001, p. 133).

Para Diker (1996 apud SIMON E MERODO in OLIVEIRA, 2001, p.168), “os sistemas nacionais de educação da qualidade deveriam ser entendidos [...] como um novo estilo de gestão política-educativa, que permite reter nos níveis centrais a capacidade de controle sobre o sistema educativo, sem intervir diretamente em sua gestão”.

Nos dizeres de Sousa (in OLIVEIRA, 2001, p. 264), a educação tem sido enfocada em duas vertente: educação como direito do cidadão e condição para sua participação política e social ou educação como condição para o desenvolvimento econômico e para inserção do Brasil no grupo dos países desenvolvidos. Assim, “a educação precisa alcançar qualidade capaz de responder às demandas decorrentes das transformações globais nas estruturas produtivas e do desenvolvimento tecnológico”.

Nas políticas de avaliação do rendimento escolar, a escola, como micro-sistema educacional, é

responsabilizada pela construção do ‘sucesso escolar’, cabendo ao poder público a aferição da produtividade, por meio de aplicação de provas de rendimento aos alunos. Este encaminhamento, ao tempo em que se revela estimulador da competição entre as escolas, responsabilizando-as, individualmente, pela qualidade de ensino e re-situando o compromisso do poder público com seus deveres, é expressão no campo educacional da defesa do Estado mínimo, em nome da busca de maior eficiência e produtividade (SOUSA in OLIVEIRA, 2001, p. 265).

Segundo Sousa,

Qualidade não é algo dado, não existe em si, remetendo à questão axiológica, ou seja, dos valores de quem produz a análise da qualidade. A emergência de critérios de avaliação não se dá de modo dissociado das posições, crenças, visão de mundo e práticas sociais de quem as concebe. É um conceito que nasce da perspectiva filosófica, social, política de quem faz o julgamento e dela é expressão. Portanto, os enfoques e critérios assumidos em um processo avaliativo revelam as opções axiológicas dos que dele participam (OLIVEIRA, 2001, p. 267).

Alguns argumentos visam evidenciar o significado da implantação de sistemas de avaliação de rendimento escolar, como instrumento de gestão educacional, que expressam uma concepção do papel do Estado na condução das políticas educacionais[1]:

- possibilidade de compreender e intervir na realidade educacional – para entender as causas dos problemas, propondo ações para sua superação e avaliando-as;

- necessidade de controle de resultados pelo Estado – devido às políticas de descentralização, há necessidade de adotar controles flexíveis, com forte avaliação de produto ou resultado;

- estabelecimento de parâmetros para comparação e classificação das escolas – para que se possam alocar os (poucos) recursos com critério;

- estímulo à escola e ao aluno por meio de premiação – “aprende-se a avaliar e a ser avaliado na escola como ato de cidadania [...] prestação de contas em ato público (FLETCHER apud SOUSA in OLIVEIRA, 2001, p. 278);

- possibilidade de controle público do desempenho do sistema escolar – para levantar e tornar públicas informações sobre o desempenho dos sistemas escolares[2].

Para Sousa, a justificativa da necessidade de dados, não se sustenta, pois há inúmeros disponíveis hoje no Brasil. Alerta que é temerário um sistema de avaliação cujo indicador nuclear seja o rendimento do aluno.

Assim, considera que o pretendido é

instalar mecanismos que estimulem a competição entre as escolas, responsabilizando-as, em última instância, pelo sucesso ou fracasso escolar. A crença subjacente é a de que o aprimoramento das práticas administrativas e pedagógicas da escola se dará em consequência, por um lado, de respostas que a própria escola vier buscar frente aos resultados por ela obtidos quando da comparação de seu desempenho com o de outras e, por outro, de ações diferenciadas que o poder público desencadear nas mesmas, premiando aquelas que apresentem ‘bons produtos’ e, se não punindo, promovendo ações específicas nas que apresentem baixo rendimento, em relação aos critérios de produtividade estabelecidos. Ao tempo em que se indaga sobre o potencial deste procedimento para gerar o esperado aprimoramento do ensino, alerta-se para o seu potencial de intensificar, sob a classificação aparentemente técnica, a seletividade social na escola (SOUSA in OLIVEIRA, 2001, p.279).

Para Sousa, “gerir o sistema público de educação de acordo com a lógica da economia de mercado tende a promover, não a sua democratização, mas o seu desmonte”(in OLIVEIRA, 2001, p. 281).

OLIVEIRA, Dalila Andrade (org.). Gestão Democrática da Educação – Desafios Contemporâneos. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.

Notas:

[1] Cf. Sousa, in Oliveira, 2001.

[2] Refere-se ao termo “accountability”, traduzido como prestar contas, que para Fletcher (apud SOUSA in OLIVEIRA, 2001), relaciona-se mais com a organização administrativa e política.

linkwithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...