A maioria de nós conhecemos João e Maria como uma fábula infantil, No entanto, a versão original dos Irmãos Grimm, registrada no início do século XIX, é muito mais sombria e angustiante, refletindo a fome e o desespero vividos pela Europa em tempos de guerra e escassez.
A Realidade Cruel por Trás da Fantasia
Na história dos Grimm, um lenhador pobre vive com sua esposa e seus dois filhos, João e Maria. A fome assola o lar. A madrasta — que em versões posteriores virou "mãe" para suavizar a trama — convence o marido a abandonar as crianças na floresta, pois "há bocas demais para alimentar e pouca comida para todos". É uma decisão desesperada, cruel e carregada de dor.
João ouve o plano e junta pedrinhas brancas durante a noite. No dia seguinte, ao serem levados para o coração da floresta, ele solta as pedras no caminho. Assim, quando o luar ilumina a trilha, as crianças conseguem retornar para casa. Mas a madrasta não desiste.
Na segunda tentativa, João não encontra mais pedrinhas, então usa migalhas de pão. Mas os pássaros comem o rastro. Perdidos de verdade, João e Maria vagam por dias. Exaustos e famintos, deparam-se com uma casa mágica feita de pão, bolo e açúcar. É o sonho de qualquer criança — ou o pesadelo prestes a começar.
A velha que os recebe parece gentil, mas esconde intenções horríveis. Ela é uma bruxa canibal que atrai crianças para devorá-las. Engana-os com alimentos e promessas de conforto, apenas para trancafiar João numa gaiola. Ela engorda o menino lentamente, examinando seus dedos a cada dia — e ele, esperto, oferece um ossinho, pois a bruxa é cega.
Enquanto isso, Maria é escravizada, forçada a trabalhar para a feiticeira. A tensão aumenta. A bruxa decide que chegou a hora de assar João. Ela manda Maria acender o forno e verificar se está quente o suficiente.
Mas Maria, em um ato de coragem e desespero, engana a bruxa. Finge não saber como entrar no forno, e quando a bruxa se aproxima para mostrar, Maria a empurra lá dentro e fecha a porta. A bruxa morre queimada, gritando.
Com a bruxa m0rta, os irmãos descobrem uma sala cheia de pedras preciosas, ouro e joias. Pegam o que conseguem carregar e fogem da casa maldita.
No caminho, são ajudados por um cisne branco que os leva pelo rio. Ao chegarem em casa, descobrem que a madrasta morreu. O pai, que havia se arrependido profundamente, os recebe com lágrimas de alegria.
Agora ricos, os irmãos garantem que nunca mais passarão fome.
Um Reflexo da Fome e do Medo
A história de João e Maria, como tantas dos Irmãos Grimm, reflete o terror da fome que assolava a Europa. Crianças abandonadas por pais desesperados, ameaças reais de morte, e o canibalismo como alegoria do desespero extremo. A floresta, símbolo da natureza cruel e implacável, e a casa doce, a armadilha do desejo, compõem um conto que vai muito além do infantil.
Embora não exista uma figura histórica exata como em outras lendas, muitos estudiosos acreditam que João e Maria é inspirada em tempos de grande miséria, especialmente durante as fomes severas da Idade Média. Registros históricos mostram que em períodos de escassez extrema, casos de abandono infantil não eram raros — e há relatos sombrios de canibalismo como último recurso.
A casa da bruxa, feita de doces, pode simbolizar o engano das aparências. Aquilo que parece um refúgio pode ser, na verdade, a armadilha mortal.
A Verdadeira História de João e Maria
João e Maria – Irmãos Grimm
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