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26/10/2025

RAPUNZEL

 A verdadeira Rapunzel foi vendida antes mesmo de nascer, no conto original dos Irmãos Grimm ela foi criada em isolamento completo e punida brutalmente por ousar amar, após ser trocada por alfaces para satisfazer o desejo de sua verdadeira mãe.


Você já ouviu a história de uma jovem de longos cabelos dourados presa em uma torre isolada, esperando ser resgatada por um príncipe encantado. Mas o que a Disney contou é apenas a superfície — uma fábula suavizada para corações infantis inocentes.

A verdadeira história, escrita pelos Irmãos Grimm no século XIX, é muito mais sombria… e humana.

Rapunzel: A Prisão Dourada da Alma

Tudo começa com um casal desesperado por ter um filho. Quando finalmente engravidam, a esposa, dominada por um desejo incontrolável por uma planta chamada rampion (ou rapôncio), daí o nome rapunzel, começa a definhar. 

— O que tens, esposa querida?

— Ah – ela respondeu —, vou morrer se eu não puder comer um pouco daquele rapunzel do jardim atrás de nossa casa.

O homem, que a amava muito, pensou: Preciso conseguir um pouco daquele rapunzel antes que minha esposa morra, custe o que custar! 

Ao cair da noite, o marido subiu no muro, pulou para o jardim da feiticeira, arrancou às pressas um punhado de rapunzel e levou para sua mulher. Ela fez imediatamente uma saborosa salada e comeu ferozmente. Estava tudo tão gostoso, mas tão gostoso, que no dia seguinte seu apetite por ele triplicou. Então, o marido não viu outra forma de acalmar a esposa, senão buscar mais um pouco.

Na escuridão da noite, pulou novamente o muro. Mas assim que pôs os pés no jardim, ele foi terrivelmente surpreendido pela feiticeira que estava em pé bem diante dele.

— Como ousa entrar em meu jardim e roubar meu rapunzel como um ladrãozinho barato? – disse ela com os olhos chispando de raiva. — Há de sofrer por isso!

— Ó, por favor – implorou ele —, tenha misericórdia, fui coagido a fazê-lo. Minha esposa viu seu rapunzel pela janela e sentiu um desejo tão intenso que morreria se não o comesse.

A feiticeira se acalmou e disse-lhe:

— Se o que está dizendo é verdade, permitirei que leve tanto rapunzel quanto queira. Só imporei uma condição: irá me dar a criança que sua mulher vai trazer ao mundo. Cuidarei dela como se fosse sua própria mãe e nada lhe faltará. O pai aceita o acordo.

E assim que a criança nasce, a bruxa a toma como sua e lhe dá o nome de Rapunzel, a mesma planta que causou sua prisão. Aos 12 anos, tranca a jovem em uma torre sem portas, com uma única janela no alto. A única forma de acesso? O longo cabelo de Rapunzel, que a bruxa usava como corda para subir. A jovem cresce em completo isolamento, sendo ensinada a temer o mundo, a obedecer cegamente… e a esconder sua própria identidade.

A história muda quando um príncipe ouve o canto melancólico da jovem ao passar pela floresta. Curioso, observa a bruxa escalando a torre e descobre seu segredo. Ele repete o gesto e encontra Rapunzel. Ao contrário da versão adocicada, eles se encontram muitas vezes em segredo e, com o tempo, planejam sua fuga.

Mas Rapunzel, inocente e ingênua, comete o erro de mencionar o príncipe à bruxa. 

— Diga-me, mãe Gothel, por que é mais difícil içar a senhora do que o jovem filho do rei? Ele chega até mim em um instante.

— Ah, criança má! – vociferou a feiticeira. — O que eu a ouço dizer? Eu pensei que a tinha separado de todo o mundo e ainda você me traiu!

Gothel, tomada pela fúria, corta os longos cabelos da jovem e a expulsa para o deserto, grávida e sozinha.

Porém, no mesmo dia em que expulsou Rapunzel, a feiticeira prendeu as tranças cortadas no gancho da janela. Quando o príncipe veio e chamou:

— Rapunzel, Rapunzel, jogue suas tranças!

Ela deixou o cabelo cair. O filho do rei subiu, mas não encontrou sua amada Rapunzel; em seu lugar aguardava a feiticeira com um olhar maléfico e peçonhento.

— Aha! – ela gritou zombeteira. — Veio buscar sua querida esposa? Mas o belo pássaro já não canta no ninho, a gata a pegou e vai riscar os seus olhos também. Rapunzel está perdida para ti, nunca mais irá vê-la.

O príncipe ficou fora de si e, em seu desespero, se atirou pela janela da torre. Ele escapou com vida, mas os espinhos em que caiu perfuraram os seus olhos. Então, perambulou cego pela floresta; não comia nada além de frutos e raízes. Tudo o que fazia era lamentar e chorar a perda de sua amada.

Ele andou por muitos anos sem destino e na miséria. E finalmente chegou ao deserto no qual Rapunzel vivia, na penúria, com seus filhos gêmeos, um menino e uma menina que haviam nascido ali.

Ouvindo uma voz que lhe parecia tão familiar, o príncipe seguiu na direção de Rapunzel e, quando se aproximou, ela logo o reconheceu e se atirou em seus braços a chorar. Duas de suas lágrimas caíram nos olhos dele e, no mesmo instante, o príncipe pôde enxergar novamente. Então, levou-a para o seu reino, onde foram recebidos com grande alegria e festas. Lá viveram completamente felizes por muitos e muitos anos.

Ao contrário da versão da Disney — onde Rapunzel é uma heroína destemida que foge de sua prisão com bravura e magia —, a versão original dos Grimm revela um conto sobre controle, posse e inocência roubada. Rapunzel é a vítima de um sequestro emocional e físico. A torre representa não só a prisão literal, mas também a opressão da mulher, do desejo, da juventude contida.

Dame Gothel, muitas vezes interpretada como vilã, pode ser vista como símbolo do medo da sexualidade feminina, da maturidade, da independência. Ela aprisiona Rapunzel para protegê-la do mundo — ou para protegê-lo dela?

O conto pode ter origens em lendas cristãs medievais sobre santas enclausuradas, como Santa Bárbara, trancada por seu pai em uma torre para preservar sua pureza. Também há paralelos com histórias de freiras e donzelas de conventos que engravidavam em segredo — e cujos filhos eram abandonados ou mortos.

O cabelo, nesse contexto, é mais do que um recurso de conto de fadas — é o símbolo da conexão com o mundo exterior, da liberdade e da sexualidade. Cortá-lo é retirar o poder da jovem, silenciar sua voz, apagar sua identidade.

Enquanto a Disney transforma Rapunzel em uma princesa com poderes mágicos, os Grimm nos mostram uma jovem que sangra, sofre, cresce. E que, mesmo após toda a dor, renasce. Não por mágica, mas pelo amor

Rapunzel - Irmãos Grimm

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